De Miguel Pereira até Governador Portela a bordo do auto de linha, era impossível não imaginar os tempos áureos da Linha Auxiliar. Fica aqui meus agradecimentos ao mestre Luís Otávio, ao grande Edson Vander Teixeira e ao bravo Adail, membros da AFPF, que deram um toque de experiência e aulas sobre a linha.
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Iniciando a expedição propriamente dita, começamos os trabalhos na estação Governador Portela, tendo o destino final a estação Arcádia. Seriam quase 20 km de “volta no tempo”, sem saber o que esperar pela frente e sem saber o que achar, pois já fazem praticamente 20 anos que o trecho está abandonado. Criminosamente abandonado, para ser mais claro. A expedição se deu na ordem das estações: Governador Portela - Francisco Fragoso - Viaduto Paulo de Frontin - Vera Cruz - Monte Líbano - Engenheiro Adel - Arcádia. Vamos em frente.
Nos arredores da estação Governador Portela se tem a clara percepção da importância que o lugar teve para a ferrovia. Lá existiam oficinas de reparo, galpões para locomotivas e um triângulo de reversão. Cabe ressaltar que de lá também saia o Ramal de Jacutinga.
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Governador Portela vai deixando aquela vontade de voltar a cada passo que se dá em direção ao próximo destino: Francisco Fragoso. Consta que ela foi demolida em 2000 para a construção de uma estação de tratamento da CEDAE (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro).
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O leito virou rua no sentido Francisco Fragoso, mas os trilhos ainda estão lá como que esperando o trem passar. Houve muita subtração de trilhos, mas em muitos lugares eles ainda persistem em não deixar os áureos tempos cair no esquecimento.
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O ar puro de Miguel Pereira, aliado as belas paisagens, proporciona um bem estar incrível, uma sensação de paz interior toma conta da pessoa. Andar nos trilhos da história, trilhando e desbravando locais pouco acessados pelo “bicho homem” faz muito, mas muito bem.
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Após um trecho de mata, chegamos num ponto onde descortina-se uma bela paisagem da Serra do Couto. Mas o cartão de visitas é uma cerca. O povo adora se apropriar indevidamente de terrenos da União. A vista é maravilhosa, o tempo passa a ser vilão nesses momentos, pois as horas acabam por passar rápido demais.
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Chegando em Francisco Fragoso fizemos uma pausa para hidratação e um breve descanso. Da antiga estação realmente não sobrou nada. Aos olhos de todos, só batendo a quilometragem mesmo e perguntando sobre a mesma. Aos nossos olhos, desgosto e tristeza. Nada restou. Nada mesmo.
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Depois de um desprazer desses, só no restava mesmo seguir em frente. O sol - ora escondido pelas nuvens, ora implacável em nossas cabeças - nos acompanha fielmente nesse trecho de serra, mas que não tem mata para nos proporcionar uma sombra. São muitas pausas para fotos, muitas paradas para admirar o meio onde estávamos. Sempre seguimos o leito, em nenhum momento saímos dele. Isso mostra que um pouco de boa vontade, muita visão de futuro e uma boa dose de conhecimento em mobilidade urbana podem trazer o trem de volta. A semente tem que ser plantada e vamos correr atrás disso.
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A próxima estação do trecho é Vera Cruz, mas antes dela ainda teríamos o prazer de conhecer o lendário e secular Viaduto Paulo de Frontin. Eu tinha o sonho de um dia fazer essa travessia. E o momento estava chegando. Em alguns lugares era possível ver, bem ao longe, o gigante de aço.
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Chegando ao Viaduto Paulo de Frontin, uma mistura de sentimentos se confundem: excitação, alegria, tristeza, ódio… Mas eu estava ali e precisava aproveitar aquele momento. Tentei entender o porque daquilo e minhas teorias da conspiração se faziam bem presentes em minha mente. Não podemos chamar isso de outra coisa que não seja crime.
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O vídeo da travessia eu postei anteriormente aqui. Vale a pena ver.
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Transposto o Viaduto, mais um problema: o leito está cercado. Um desafio a mais para ultrapassarmos. Mas passado esse desencontro, logo chegamos na estação Vera Cruz. A caixa d’água que alimentava as vaporosas denuncia a proximidade da mesma.
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A estação não chega a estar descaracterizada. Está habitada e, até certo ponto, conservada. Mas os puxadinhos existentes denunciam que num futuro próximo isso pode se reverter. A pausa nos arredores foi rápida, uma vez que já tínhamos estourado o planejamento do horário proposto para toda a expedição. Fomos a passos largos para encontrar os vestígios da parada Monte Líbano. Sempre seguindo o leito. Um até breve, Vera Cruz. Voltarei.
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Sem a paciência habitual para observar os vestígios deixados pelo tempo e abandono da linha, seguimos em frente e algum tempo depois encontramos o que sobrou da parada Monte Líbano: alguns pedaços de concreto e mais nada. Os vestígios estão num estado em que falta pouco para desaparecerem. Não tivemos tempo para chorar o defunto, fomos em busca da parada Engenheiro Adel. Essa parada, em fotos existentes, mostram que o estado é similar a encontrada em Monte Líbano. Vamos atrás.
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A paisagem da Serra do Couto em conjunto com o Rio Santana forma essa pintura da foto abaixo. O leito começa a adentrar a mata muito fechada, dando a impressão de que tem muita coisa preservada dentro da mesma. E não era engano. Os trilhos lá estão, como aguardando a liberação do tráfego para os trens seguirem. Olho para o nobre companheiro Edson Vander Teixeira (que chegou a trabalhar na RFFSA e passou pelo trecho ainda operacional) e vejo a emoção de estar ali naquele momento, vendo o passado passando em sua cabeça saudosista e o presente de abandono em seus olhos mareados.
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Saímos do trecho de mata e onde se pensava ser a parada Engenheiro Adel, constatamos que a quilometragem não batia e que nada ali lembrava uma parada ou estação. As fotos que circulam na internet estão errada. Segundo o Edson Vander Teixeira, o que pode ter existido ali seria um posto telegráfico, de observação… enfim. Nem ele mesmo lembrava, o que leva a crer que foi desativado num passado bem distante. Para coroar a dificuldade que passamos na mata, fomos premiados com um belo mirante natural.
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Mais à frente adentramos mais um trecho de mata fechada. Nesse trecho, encontramos alguns deslizamentos de terra. Consta na história que os deslizamentos eram muito comuns no trecho e dado o tempo de inatividade da linha, meio que isso nos assustou. Nada que justifique seu abandono, mas uma coisa séria a ser pensada na tão sonhada reativação desse trecho.
A bateria da minha câmera e do meu celular estavam no fim e dentro da mata encontramos uma caixa d’água. Mas o que faria uma caixa d’água ali no meio do nada? A resposta viria metros adiante: a verdadeira parada Engenheiro Adel. Lá estava ela, frente a frente conosco. O espanto de alguns contrastavam com a surpresa de outros: achamos! E um achado como esses não apenas alegra, como reforça que a busca pelo desconhecido, pelo abandonado, pelo largado, pelo esquecido, recompensa aos pesquisadores. Eu poderia ficar ali o tempo que fosse, mas o sol já estava se pondo e ainda tínhamos alguns quilômetros até Arcádia, o ponto final de nossa expedição.
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Saímos em disparada, mas a noite queria cair de forma bem rápida. Algumas centenas de metros depois de Engenheiro Adel, fomos forçados a sair do leito e seguir por uma estrada de terra batida margeando o Rio Santana. Foi a melhor escolha a ser feita. A noite caiu, tal qual a escuridão imposta a Linha Auxiliar. Ainda tivemos tempo de ver uma ponte no leito ao longe, e nada mais. Andamos por quase uma hora pela estrada e chegamos em Arcádia. Não na estação, como queríamos, mas em uma parada obrigatória para os viajantes, onde comemos e descansamos com um bom papo, traçando planos para a volta e a conclusão do trecho que ficou faltando. Que expedição! Foram 20km que revigoraram meu fim de ano.
Meus sinceros agradecimentos à equipe da AFPF, ao meu povo do Trilhos do Rio e a Linha Auxiliar nesse magnífico trecho. Ficou a saudade e a vontade de um quero mais, que logo logo se repetirá.
Até a próxima.